Esta semana foi marcada por um ilustre e querido personagem. Walter Casagrande Júnior, também conhecido como Casão, ex-jogador e comentarista de futebol da Rede Globo.
Na última terça-feira, Casagrande lançou um livro contando a sua história. Uma história muito dura mas com final feliz.
Num depoimento honesto e revelador, Casagrande conta ao Fantástico como desceu até o
fundo do poço das drogas. E como foi que voltou, para contar essa história.
“O túnel do dependente químico é longo, muito longo e escuro. Mas tem uma luz lá no fundo do túnel, lá tem uma luz. É que você não vê, você não consegue enxergar a luz, porque você está tão envolvido com a droga e você precisa de uma chacoalhada pra acreditar que tem uma luz, aí você começa a ver e você vai ao encontro dela. Por que que eu ia guardar esse segredo pra mim, meu?
O relato é de um homem famoso que usou drogas e preferiu não se calar. Nessa entrevista ao Fantástico, Casagrande respondeu a todas às perguntas.
“Por eu ter sido atleta e de ponta, treinava muito, ter uma resistência física muito boa, era difícil me dar pane, era difícil alguma droga me tirar do controle, do uso, do efeito dela. Eu sempre achava que eu podia um pouquinho mais. Medicamentos com álcool, junto com cocaína, junto com droga injetável, fazia essas misturas constantemente”.
Walter Casagrande Júnior completa 50 anos amanhã e tem muito pra contar. O comentarista de futebol se expôs publicamente, na biografia lançada esta semana: "Casagrande e seus demônios".
"Eu tinha visões horríveis, tudo parecia muito real, via demônios pelo apartamento inteiro. Eram maiores do que eu, com dois ou três metros de altura. Isso durou um mês, sei lá, um mês e meio,
eu entrei em surto psicótico pelo uso exagerado de drogas e privação de sono".
“Eram sensações mesmo, sensações, ver vultos ou olhar pro sofá da sala e ver o sofá num formato que tinha que ter um formato ali, alguma coisa tava sentado ali, sabe. A parte que você senta afundada, marcas no braço do sofá”.
O livro fala das overdoses de Casão, como ele é conhecido. Em uma das vezes que passou mal, um dos três filhos estava em casa. Os dois se preparavam pra jantar fora, quando Casagrande usou cocaína e heroína.
“Eu ia usar e eu não ia poder sair com ele, não ia dá pra sair com ele, foi droga injetável, não ia dá, ele ia sair do banheiro e eu ia ta completamente transtornado, ia falar pra ele: ‘mano, não vou jantar mais’”.
"Botei tudo de uma vez, rapidamente, pois o Leonardo estava em casa e podia aparecer a qualquer momento. Houve uma explosão no meu peito. Explodiu mesmo: buumm. Saí cerca de um metro do solo , bati contra a parede e caí no chão"
“Uma das piores situações que eu passei do envolvimento meu com a droga foi desse dia”, conta Casagrande.
Um acidente de carro no dia 22 de setembro de 2007, um sábado, obrigou Casagrande a parar com as drogas.
“Eu adormeci numa descida e o meu pé caiu do acelerador, eu acelerei, capotei com o carro, quando eu acordei eu estava no Hospital Einstein, a primeira vez, quando eu acordei a segunda vez eu tava internado na clinica. Foi a virada aí da historia. E qual é a conclusão que eu chego disso daí? Era o seguinte: aquele sábado era o limite. Alguma coisa tinha que acontecer”, conta.
A internação numa clínica de recuperação para dependentes químicos aconteceu sem que ele soubesse. A autorização foi assinada pelo filho mais velho dele, seguindo o aconselhamento dos médicos.
“Foi a melhor coisa que aconteceu na minha vida e o melhor que poderia ter acontecido naquele momento”, admite.
Repórter: Você tentou até que meio um jeito de sair de lá.
“É, não foi acreditar, foi não aceitar. Eu não aceitava estar lá, não aceitava que eu era doente, meu pensamento era ainda aquele de um dependente químico em atividade - ah, amanhã eu paro, eu paro quando eu quiser, não preciso estar internado aqui, se eu não quiser usar amanhã eu não uso - que é uma bobagem, mentira, você está dominado pela droga, é tudo justificativa de um dependente químico”, diz.
"De fato, eu entrei no tratamento, fiz tudo direitinho, comecei a acreditar nos psicólogos e naquilo que eles falavam pra mim", diz um trecho do livro.
Ele teve de esperar oito meses pra receber a primeira visita da família - os três filhos.
“Foi engraçado ver o jeitão deles assim, são três caras, um mais fechadão, um pouco mais agressivo comigo, o outro bem paizão. Filho, mas com comportamento de paizão, compreensivo e tal. Foi legal”, diz.
Depois de um ano, Casão voltou à vida do lado de fora da clínica.
“O meu suporte atrás foi o trabalho, eu não tenho dúvida disso. A família ajudou? Ajudou! Tive o apoio dos lados da família. Quando eu caia para um lado tinha os meus pais, quando eu caía pro outro lado, tinha os meus filhos, os amigos, mas as minhas costas tava apoiada na TV Globo”, afirma.
O livro também relembra os bons momentos do ex-atacante, que já jogou no São Paulo, no Flamengo, em times da Europa. A estreia como profissional no Corinthians em 82 foi um sucesso. Ele fez quatro, dos cinco gols do time.
“Tudo que eu fiz naquele jogo, deu certo. Tudo, sabe, tudo. Era uma coisa tão absurda que chegou uma hora no segundo tempo, eu já tinha feito os 4 gols eu olhava para o time do Corinthians assim, eu comecei a ficar constrangido”, lembra.
No futebol, Casão encontrou um grande companheiro: o doutor Sócrates. "Sem dúvida foi meu maior parceiro no futebol. Quando eu era juvenil no Corinthians, eu o tinha como ídolo e costumava ficar ao lado do campo para vê-lo nos treinamentos do time profissional", lembra em outro trecho do livro.
“Nós tínhamos mesmo um complemento muito forte, o meu jeito de jogar, o meu modo de pensar, futebolisticamente falando, completava o modo dele e era um gênio do futebol, um cara genial que fazia coisas fantásticas que você menos esperava”, afirma Casagrande.
O amigo Sócrates morreu em dezembro de 2011. O álcool levou o ex-jogador à morte. Casagrande conseguiu se despedir dele do jeito que queria.
“Eu tive a intuição e veio a vontade de olhar pros olhos dele e dizer: ‘Magrão, eu te amo cara. Você foi um dos caras mais fantásticos que eu conheci’. E saber isso aí me alivia. Não é uma coisa que é simples de falar, não é uma coisa que é simples de ouvir, não é uma coisa que é simples de lembrar, porque eu gostaria muito de lembrar disso que eu estou te falando e sair daqui e tomar uma cerveja com o Magrão e dizer assim: o Magrão, eu te amo ainda, entendeu. E eu não posso mais”.
Hoje Casagrande conta com a ajuda de três psicólogas e uma psiquiatra.
“Minha vida mudou muito. E não é que ela mudou por obrigação; mudou porque ela mudou mesmo, no jeito. Hoje eu vivo bem sozinho, entendeu? Antes eu não suportava o meu jeito, então eu saia muito, eu tava muito na rua, eu tava, eu usava ate droga para dar uma congelada no emocional mesmo, conseguir me suportar e tal”.
Eu quero viver como eu vivo hoje. Eu só não quero continuar sendo escravo da droga.
Fantástico: Você não leu o seu livro ainda?
Casagrande: Não, ainda não li.
Fantástico: Por quê?
Casagrande: Não li porque não me dá coragem ainda de algumas histórias. Eu quero pegar e ler, do início ao fim. Eu não quero pegar os capítulos. Eu podia muito bem ler os capítulos leves, ouvir as brincadeiras que eu fazia com os meus amigos na minha adolescência, ver as brincadeiras que eu fazia com o Paulo Roberto que jogava comigo no Corinthians, Paulo Roberto jogava no Grêmio, enfim, eu podia fazer isso, mas é, eu estou curioso também pra ver, para ler as partes ruins da minha vida. Eu ainda não tenho coragem.
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