terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Venda de remédio para hiperatividade sobe 75% de 2009 a 2011, diz Anvisa

Remédio hiperatividade (Foto: Anvisa/Divulgação)

Um levantamento feito pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aponta que as vendas no país do remédio cloridrato de metilfenidato, usado para o tratamento de transtorno de deficit de atenção e hiperatividade (TDAH), aumentaram quase 75% para crianças e adolescentes de 6 a 16 anos, no período de 2009 a 2011.
Em 2009, foram comercializadas 557.588 caixas – ou 156.623.848 mg – do medicamento
em todo o Brasil, para todas as faixas etárias. Em 2011, foram vendidas 1.212.850 caixas ou 413.383.916 mg do produto. Os resultados integram o Boletim de Farmacoepidemiologia da Anvisa, divulgado nesta segunda-feira (18).
Esse número abrange os registros de 47 mil farmácias e drogarias particulares do país, coletados pelo Sistema Nacional de Gerenciamento de Produtos Controlados (SNGPC). Os dados do Sistema Único de Saúde (SUS) não entram na conta.
Esse sistema informatizado forneceu um panorama de como está a situação de venda de medicamentos como Ritalina, Ritalina LA e Concerta em todas as capitais e os estados. Segundo a coordenadora do SNGPC, Márcia Gonçalves, essa movimentação de remédios controlados é monitorada por meio das receitas médicas e das notas fiscais emitidas.
"Os dados apresentados no boletim são, de fato, a melhor evidência em relação à prescrição e ao consumo de metilfenidato no país, mas não temos como fazer constatações sobre o aumento do diagnóstico, pois isso exigiria estudos bem mais detalhados, envolvendo aspectos epidemiológicos de TDAH e dados de outras fontes", diz Márcia.
De acordo com ela, o objetivo do levantamento é servir de base para pesquisas mais aprofundadas e contribuir para uma maior reflexão sobre a prescrição e o uso racional de remédios para hiperatividade.
"Em muitos momentos somos questionados, pois há uma grande especulação em torno da Ritalina", diz. Além desse remédio e do Concerta, existe o Venvanse, que não foi incluído no levantamento porque seu registro na Anvisa é recente, segundo Márcia.
Os dados apresentados no boletim são, de fato, a melhor evidência em relação à prescrição e ao consumo de metilfenidato no país"
Márcia Gonçalves,
coordenadora do SNGPC da Anvisa
Uso por região
Em números absolutos, os estados que mais consumiram cloridrato de metilfenidato entre 2009 e 2011 foram: Rondônia (Norte), Piauí (Nordeste), Goiás (Centro-Oeste), Minas Gerais (Sudeste) e Rio Grande do Sul (Sul), além do Distrito Federal – que registrou o maior uso do remédio no período, com um aumento de 30% e mais de 114 caixas vendidas por grupo de mil crianças e adolescentes.

Já os estados que tiveram o maior aumento no uso ao longo desses três anos foram: Roraima (Norte), Bahia (Nordeste), Mato Grosso do Sul (Centro-Oeste), São Paulo (Sudeste) e Paraná (Sul).
"Todos os estados do Centro-Oeste, Sudeste e Sul tiveram um aumento real no consumo, com exceção do Rio de Janeiro", diz Márcia.
Segundo a coordenadora do SNGPC, o boletim da Anvisa não contempla dados de prevalência de TDAH ou outros aspectos que justifiquem o uso maior ou menor em alguns estados.
"Estudos de prevalência no Brasil e no mundo ainda são muito escassos e com resultados variáveis. Por isso, insistimos que esse trabalho é uma forma de produção de conhecimento que deve despertar pesquisas mais amplas sobre o tema", afirma.
Aumento no 2º semestre
O levantamento da Anvisa observou, ainda, que houve redução no consumo de metilfenidato entre os meses de férias escolares e aumento no segundo semestre de cada ano avaliado.

Na opinião do psiquiatra Ênio Roberto de Andrade, diretor do Serviço de Psiquiatria da Infância e da Adolescência do Hospital das Clínicas (HC) em São Paulo, as razões disso são o alto custo do medicamento e o fato de que, até o primeiro semestre, os pais ainda acham que o filho pode ir bem na escola sem controlar a hiperatividade.
Todos os estados do Centro-Oeste, Sudeste e Sul tiveram um aumento real no consumo, com exceção do Rio de Janeiro"
Márcia Gonçalves,
coordenadora doSNGPC da Anvisa
"Quando eles veem que há o risco de a criança perder o ano, a procura pelo remédio cresce. Teoricamente, o produto deveria ser de uso contínuo. A gente orienta, mas os pais param por um motivo óbvio, o econômico", destaca. Andrade explica que não há drogas genéricas, mas a Ritalina, por exemplo, é distribuída no SUS.
De acordo com o estudo da Anvisa, o gasto estimado das famílias brasileiras com o produto em 2011 foi de R$ 28,5 milhões. A quantia equivale a R$ 778,75 por mil crianças entre 6 e 16 anos.
Análise dos resultados
Andrade reforça que é impossível saber se a pesquisa reflete um aumento no diagnóstico de TDAH no país. Ele diz que a Anvisa se preocupa com essa questão por ser um medicamento de uso controlado, para ver se ele está sendo comercializado de forma adequada.

"Para saber se está havendo um excesso de diagnóstico, é necessário conhecer o número de pessoas diagnosticadas na população e quantas são tratadas. Se esse aumento ultrapassar a prevalência, está tendo abuso. Mas nem nos EUA, onde mais se diagnostica hiperatividade, a prescrição chega ao número de prevalência", aponta.
O psiquiatra do HC afirma que a prevalência do transtorno varia de 3% a 5% no mundo, e estatísticas mais conservadoras indicam até 8%.
Atuação do remédio e sintomas
Andrade esclarece que a Ritalina e os remédios do gênero são estimulantes que agem sobre o córtex pré-frontal, parte do cérebro localizada bem na frente da testa. Segundo as teorias mais aceitas, ao ter esse lóbulo ativado, a pessoa consegue manter o foco e a atenção.

"É normal acharem que precisa dar calmante para quem tem TDAH, mas isso é errado", diz o médico.
"Para saber se está havendo um excesso de diagnóstico, é necessário conhecer o número de pessoas diagnosticadas na população e quantas são tratadas"
Ênio Roberto de Andrade,
psiquiatra do HC-SP
Ainda segundo ele, antigamente acreditava-se que o problema desaparecia na adolescência, mas o que muda são as manifestações. Isso porque crianças agitadas correm e pulam, já os adultos ficam inquietos, mudam de alvo, abrem várias telas no computador ao mesmo tempo e não conseguem terminar o que começaram.
De acordo com a Anvisa, embora a taxa de TDAH diminua com a idade, pelo menos metade das crianças com o transtorno têm sintomas incapacitantes que persistem na vida adulta.
Além disso, estudos têm apontado que há entre 4 e 9 meninos com TDAH para cada menina. Mas, de acordo com o psiquiatra do HC, o fato é que eles incomodam mais os pais que elas, por isso vão mais ao médico e são tratados com maior frequência.
O diagnóstico de TDAH ocorre por meio da observação de comportamentos de impulsividade, inquietação, dificuldade de aprendizagem, transtornos de conduta e ansiedade. Ele depende muito dos relatos de pais e professores, pois não há um exame laboratorial para detectá-lo.
De acordo com o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos EUA, em 2007 aproximadamente 9,5% (5,4 milhões) de crianças e adolescentes americanos entre 4 e 17 anos tinham TDAH.
Luna D'AlamaDo G1, em São Paulo

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