sexta-feira, 20 de julho de 2012

Há 31 anos sem carteira, doméstica no CE não tem como provar serviços

Lucilene disse que "não pensou direito" quandoi foi perguntada pelos atuais patrões se queria carteira assinada. (Foto: Ilo Aguiar/G1)

A empregada doméstica Lucilene Félix, de 42 anos, trabalha desde os 11 anos e gostaria de se aposentar. A trabalhadora, no entanto, nunca teve carteira assinada e não tem como comprovar o tempo de serviço. "Eu penso em me aposentar, mas preciso primeiro me
organizar e começar a pagar uma previdência dessas. Muitas patroas que tive eu não sei nem onde moram mais. Não tenho como provar", afirmou.

Lucilene faz parte de uma estatística divulgada nesta quinta-feira (19) pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), que aponta ser menos de 10% o índice de trabalhadores domésticos formalizados no Ceará. O levantamento mais recente é de 2009. Pelas regras atuais, a mulher pode se aposentar por tempo de serviço, após 30 anos de contribuição.
Atualmente, ela recebe salário de R$ 1400,00 para trabalhar em uma casa onde cuida de uma idosa e cozinha. Há oito anos, dorme todos os dias no trabalho e tem folgas nos fins de semana a cada 15 dias. Mesmo recebendo mais que o equivalente a um salário mínimo, a empregada diz que não acha um salário justo, embora não reclame dos atuais patrões.
Lucilene afirma ter sido uma opção dela não ter carteira assinada, porque "não pensou direito no caso". "Aqui, logo quando eu cheguei, eles perguntaram e eu não sabia se eu ia continuar, se ia passar o mês só", explica. Lucilene diz que hoje se arrepende e pensa em fazer uma proposta para que os patrões paguem 50% do equivalente ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
O aluguel, segundo a doméstica, é o que acaba pesando mais no orçamento. Lucilene tem três filhos. O único que morava com ela morreu há menos de um mês. Com a perda, mudou-se para um imóvel menor, onde paga aluguel de R$ 250,00. "A casa que eu estava antes custava R$ 330,00, porque era de dois quartos. Mas não dava mais para morar lá. O aluguel é o que pesa mais, porque tem de pagar todo mês", diz.
Estudos
Lucilene é de Quixadá, no Sertão Central cearense, mas se mudou para Fortaleza ainda pequena. "Com 8 ou 9 anos, eu cuidava dos meus três irmãos menores, enquanto meus pais trabalhavam. Aí, eu mesma resolvi trabalhar".

Na época, ela argumenta que não havia muito incentivo para os estudos. "Meu pai era muito rígido e ainda bebia. Não tinha esse pensamento de estudar. Minha mãe não gostou muito porque eu tomava conta dos meus irmãos, mas aceitou", lembra. A mãe ia buscá-la todos os fins de semana e uma tia passou a cuidar das outras crianças.
Um arrependimento que Lucilene diz carregar consigo é não ter continuado os estudos e, segundo ela, ter decidido trabalhar tão cedo. "Estudei pouco. Parei na 1ª série (do ensino fundamental). Não deu tempo para estudar, desde que comecei a trabalhar. Tenho vontade de voltar a estudar", afirma a doméstica.
Lucilene recorda que, na época, nenhuma patroa aceitava que as empregadas trabalhassem e estudassem. "Hoje em dia já tem, né?", pondera.
Aos filhos, ela conta que buscou dar um pouco mais de atenção nos estudos. "Meus filhos já estudaram mais que eu. O meu menino que morreu fez cursos de cabeleireiro, de costureiro. Os outros dois também estudaram, terminaram o ensino médio".
Ela não tem como mudar o passado, mas faz planos para  futuro. "Para o futuro, eu pretendo comprar um terreno para fazer uma casa para mim", projeta.
Pesquisa
Apenas 28,6% dos trabalhadores domésticos (diaristas, empregados e jardineiros, por exemplo) possuíam carteira assinada em 2009, segundo levantamento da Organização Internacional do Trabalho (OIT). O índice do Ceará, menor que 10%, está abaixo da média nacional. Em São Paulo, Santa Catarina e Distrito Federal, o número de empregados domésticos formalizados chega a 40%.

Giselle DutraDo G1 CE



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